Em recente decisão do Tribunal Regional da Primeira Região, o escritório Sebba e Lopes obteve a reforma da sentença de primeiro grau para fins de afastar a aplicação da malsinada capitalização de juros. Os Desembargadores entenderam que em contratos de financiamento estudantil é incabível a prática da capitalização de juros. Ademais, os Desembargadores ainda reduziram para 3,9% os juros cabíveis em contratos do FIES. Veja abaixo inteiro teor do acórdão:
APELAÇÃO CÍVEL N. 2009.34.00.07980-4/BA
RELATÓRIO
A Exma. Sra Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):
Cuida-se de apelação interposta por FULANO DE TAL
de sentença proferida nos autos de ação monitória que lhe move a CAIXA ECONOMICA
FEDERAL – CEF, e que rejeitou os embargos monitórios opostos.
Alega inepcia da
inicial, tendo em vista que a CEF não fez constar a evolução do saldo
devedor.
No mérito, alega haver desproporção entre o valor financiado
e o valor ao qual pretende a CEF receber, desvirtuando o seu caráter social.
Afirma que em relação à capitalização de juros, ela não foi legitimamente
pactuada, não devendo incidir.
Pugna, também, pela nulidade da tabela price, além de se
determinar o recálculo e atualização dos valores objeto do contrato com a
incidência de juros simples de 3,40%, e a repactuação do prazo para
parcelamento do saldo devedor em três vezes o período que o recorrente foi
beneficiado pelo crédito, ou seja, por seis anos.
Contrarrazões as fls. 119/138.
É o relatório.
VOTO
A Exma. Sra Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):
INÉPCIA
DA INICIAL.
Em relação à inépcia da inicial, não prospera o alegado.
A Caixa Economica Federal juntou com a inicial os extratos
referentes ao contrato de FIES (fls. 17/19), e também planilha de evolução
contratual (fls. 21/24), atendendo ao disposto no art. 1102-A e seguintes do
CPC. Além disto, estão presentes os requisitos do art. 282 do CPC.
CAPITALIZAÇAÕ
MENSAL DE JUROS
Em relação à capitalização de juros, a matéria já foi objeto
de recurso repetitivo no Superior Tribunal de Justiça, tendo assim decidido:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO
DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL (FIES). PRESTAÇÃO DE GARANTIA. EXIGÊNCIA DE FIADOR.
LEGALIDADE. ART. 5º, VI, DA LEI 10.260/2001. INAPLICABILIDADE DO CDC.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. VEDAÇÃO. PRECEDENTES DESTA CORTE.
Recurso especial da Caixa Econômica Federal: 1. Caso em que
se alega, além de dissídio jurisprudencial, violação do artigo 5º, III e IV, da
Lei nº 10.260/01, ao argumento de que não há ilegalidade em se exigir fiador
para a celebração de contrato de financiamento educacional, uma vez que o
referido preceito normativo autoriza tal conduta, a qual possui índole
eminentemente discricionária, não podendo o Poder Judiciário nela adentrar.
2. É de se reconhecer a legalidade da exigência de prestação
de garantia pessoal para a celebração de contrato de financiamento estudantil
vinculado ao Fies, dado que a própria lei que instituiu o programa prevê, expressamente,
em seu artigo 9º, a fiança como forma principal e específica a garantir esses
tipos de contrato, seguida do fiador solidário e da "autorização para
desconto em folha de pagamento", de modo que o acórdão atacado, ao
entender de modo diferente, negou vigência à referida lei.
3. Ademais, o fato de as Portarias ns. 1.725/2001 e
2.729/2005 do MEC admitirem outras formas de garantias, que não a fiança
pessoal, apenas evidencia que tal garantia, de fato, não é a única modalidade
permitida nos contratos de financiamento estudantil, sem que com isso se afaste
a legalidade de fiança.
4. A
reforçar tal argumento, as Turmas de Direito Público do STJ já assentaram
entendimento no sentido da legalidade da exigência da comprovação de idoneidade
do fiador apresentado pelo estudante para a assinatura do contrato de
financiamento vinculado ao Fies, prevista no artigo 5º, VI, da Lei 10.260/01, a
qual será aferida pelos critérios estabelecidos na Portaria/MEC 1.716/2006.
Precedentes: REsp 1.130.187/ES, Rel. Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, DJe 20/10/2009; MS 12.818/DF, Rel. Ministro José Delgado, Rel.
p/ acórdão Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ 17/12/2007; REsp
772.267/AM, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 29.06.2007; Resp
642.198/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 03.4.2006;
REsp 879.990/RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 14/5/2007.
5. Assim, consoante bem asseverou o Min. Mauro Campbel no
Agrg no Ag n. 1.101.160/PR, DJ 16/9/2009, "se é legal a exigência de comprovação
de idoneidade do fiador, quanto mais legal será a própria exigência de
apresentação de fiador pelo estudante para a concessão do crédito estudantil
ofertado pelo Fies, de forma que não se pode reconhecer a legalidade de
obrigação acessória sem o reconhecimento da legalidade da obrigação principal
no caso em questão".
6. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de
controvérsia, submetido ao regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
7. Recurso especial provido, para que seja autorizada à
instituição financeira a exigência de garantia pessoal para a celebração do
contrato de financiamento estudantil.
Recurso especial de Eliziana de Paiva Lopes:
1. Caso em que se pugna a incidência do Código de Defesa do
Consumidor, a declaração de ilegalidade da cobrança de juros capitalizados e,
por conseguinte, a repetição simples do valor pago a maior e a inversão dos
ônus sucumbenciais.
2. A
hodierna jurisprudência desta Corte está assentada no sentido de que os
contratos firmados no âmbito do Programa de Financiamento Estudantil - Fies não
se subsumem às regras encartadas no Código de Defesa do Consumidor.
Precedentes: REsp 1.031.694/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ
de 19/6/2009; REsp 831.837/RS, Rel.
Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 17/6/2009; REsp 793.977/RS, Rel. Min. Eliana Calmon,
Segunda Turma, DJ 30/4/2007.
3. A jurisprudência desta Corte mantém-se firme
no sentido de que, em se tratando de crédito educativo, não se admite sejam os
juros capitalizados, haja vista a ausência de autorização expressa por norma
específica. Aplicação do disposto na Súmula n. 121/STF.
Precedentes: REsp 1.058.334/RS, Rel. Ministro Teori Albino
Zavascki, Primeira Turma, DJe 30/6/2008; REsp 880.360/RS, Rel. Ministro Luiz
Fux, Primeira Turma, DJe 5/5/2008; REsp 1.011.048/RS, Rel. Ministro Castro
Meira, Segunda Turma, DJe 4/6/2008; REsp n. 630.404/RS, Rel.
Min. João Otávio de Noronha, DJ de 26/2/2007; REsp n.
638.130/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 28/3/2005.
4. Por conseguinte, havendo pagamento de valores indevidos,
o que será apurado em sede de liquidação, é perfeitamente viável a repetição
simples ou a compensação desse montante em contratos de financiamento
estudantil.
5. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de
controvérsia, submetido ao regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
6. Ônus sucumbenciais invertidos.
7. Recurso especial provido, nos termos da fundamentação
supra.
(REsp 1155684/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 12/05/2010, DJe 18/05/2010)
TABELA
PRICE
Em relação à tabela price, a sua utilização deve ser
utilizada aplicando-se aos cálculos, juros simples.
JUROS
DE 3,4% A.A
A Lei 12.202/2010, ao alterar o disposto na Lei 10.260/2001
estabeleceu que:
A redução dos juros, estipulados na forma do inciso II deste
artigo, incidirá sobre o saldo devedor dos contratos já formalizados.
A Resolução n. 3842/2010, em seu artigo 1º, assim disciplina:
Art. 1º Para os contratos do FIES celebrados a partir da
data de publicação desta resolução, a taxa efetiva de juros será de 3,40% a.a.
(três inteiros e quarenta centésimos por cento ao ano).
O artigo 2º estabeleceu que para o saldo devedor dos
contratos já formalizados, incidiria a citada taxa efetiva de juros.
Art. 2º A partir da data de publicação desta resolução, a
taxa efetiva de juros de que trata o art. 1º incidirá sobre o saldo devedor dos
contratos já formalizados, conforme estabelecido no § 10 do art. 5º da Lei nº
10.260, de 12 de julho de 2001.
Desta forma, não se pode fazer com que a taxa de 3,4% a.a.
incida desde a assinatura do contrato. Deverá incidir apenas sobre o saldo
devedor a partir da data da publicação da citada Resolução.
Neste sentido:
EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL -
FIES.
A redução de juros prevista no artigo 5º, § 10, da Lei nº
12.202/2010 e na Resolução BACEN nº 3.842/2010 somente incide sobre o saldo
devedor existente a partir de 10/03/2010.
( 50001380320104047106,
TRF4, 18/03/2011)
REPACTUAÇÃO
O autor requer a repactuação do prazo para parcelamento do
saldo devedor em três vezes o período em que foi beneficiado pelo crédito, haja
vista a previsão da alínea B do inciso V do art. 5º da Lei n. 10260/2001,
alterado pela Lei n. 12.202/2010.
Não pode o Judiciário intervir no contrato e alterar os prazos
inicialmente pactuados, devendo incidir os critérios utilizados nos contratos
de financialmente estudantil, relativos a amortização e prazos, vigentes à data
da celebração do contrato, salvo alteração legal que estabeleça em contrário.
Ante ao exposto, dou parcial provimento a apelação, para
acolher parcialmente os embargos monitórios, e reformar parcialmente a
sentença, devendo ser recalculada a dívida sem a incidência de capitalização
mensal dos juros.
É como voto.
APELAÇÃO CÍVEL
2009.34.00.007988-4/DF
Processo na Origem: 79133820094013400
RELATOR(A)
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:
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DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA
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APELANTE
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:
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LUIZ CESAR BARBOSA LOPES
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ADVOGADO
|
:
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CINDY TOLEDO COSTA SEBBA E OUTROS(AS)
|
APELADO
|
:
|
CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF
|
ADVOGADO
|
:
|
RAMON DANTAS MANHAES SOARES E OUTROS(AS)
|
EMENTA
AÇÃO MONITÓRIA. FUNDO
DE FINANCIAMENTO AO ESTUDANTE DO ENSINO SUPERIOR - FIES. INEPCIA DA INICIAL: INOCORRÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS.
VEDAÇÃO. RECURSO REPETITIVO. TABELA PRICE. ALTERAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS.
IMPOSSIBILIDADE.
1. Estando a petição inicial da ação monitória acompanhada com
o contrato, extratos e planilha de evolução da dívida, não prospera a alegação
de inépcia da inicial..
2. O STJ, em julgamento submetido ao regime do artigo 543-C do
CPC, decidiu pela impossibilidade de capitalização mensal de juros nos
contratos do FIES. (RESP 1155684/RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves).
3. A
Lei 12.202/2010 determinou que a redução dos juros incide sobre o saldo devedor
dos contratos já formalizados, tendo a Resolução n. 3842/2010 do Banco Central
estabelecido que a partir de sua publicação a taxa efetiva de juros de 3,4% a.a
(três vírgula quatro porcento ao ano) incide sobre os contratos já em vigor. Sentença
parcialmente reformada.
4. Impossibilidade de repactuação do prazo para parcelamento do
saldo devedor, porque deve incidir os critérios utilizados nos contratos,
relativos a amortização e prazos, vigentes à data da celebração do contrato,
não podendo o Judiciário intervir.
5. Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, a unanimidade, dar parcial provimento à apelação.
Brasília-DF, 19 de setembro de 2011.
SELENE MARIA DE
ALMEIDA
Desembargadora Federal – Relatora